Hoje eu vou falar um
pouquinho sobre birras infantis... É, isso sim... aquilo que as crianças gostam
de fazer em pleno Shopping Center (ou qualquer outro espaço público e, de
preferência, bastante cheio), se jogando
no chão, chorando, ou melhor, berrando, batendo as pernas, os braços e todas as
outras partes do corpo e que matam de vergonha qualquer mãe e pai.
Nesse momento todos devem
estar pensando: o Tomaz já faz birras? Não, gente, ele ainda não faz! Eis que deve
ter surgido outra pergunta: e por que ela resolveu falar sobre isso, se o foco
de discussão desse blog é o desenvolvimento do Tomaz (aqui ele é quase o centro
do universo)?
A verdade é que faço parte
de uma comunidade no facebook chamada de Cantinho Pais e Filhos. Lá é um espaço
bem bacana, no qual discutimos sobre temas variados ligados à maternidade,
compartilhando experiências, dividindo angústias, recebendo ajuda, enfim,
deixando mais leve e feliz nossas viagens de mãe.
Acontece que ontem o tema de
discussão era esse: birra infantil. Em um dos posts colocados por uma mãe havia a
indagação sobre o que fazer nessas situações. Foi então que me dei conta de que esse é
um tema recorrente e difícil de ser manejado e, por isso, decidi escrever aqui.
Esse post, na verdade, é uma
forma de agradecer as participantes do cantinho (coloquei as porque até hoje só encontrei mamães por lá) por tudo que têm me ajudado. Assim, agora estou
dizendo: sou eu quem vou ajudar vocês (ou ao menos vou tentar).
Bem, vamos lá. Na hora que
seu filho se joga no chão o que você deve mostrar a ele é que a mãe, o pai ou
qualquer outro cuidador é uma figura de autoridade que merece respeito. Não
adianta, DE FORMA ALGUMA, dizer a ele: “eu vou embora viu! Você vai ficar aí
SOZINHO” (normalmente os pais e mães recorrem a esse tipo de ameaça)!
Gente, ações como essa,
longe de resolver nosso problema, terminam por criar outros muitos, os quais
falarei a seguir: criança alguma deve temer o abandono.
Se há algo cruel que podemos fazer com os filhos é ameaça-los de abandono,
visto que, do ponto de vista psíquico, é impossível uma criança pequena
suportar o abandono de alguém significativo para ela (como são os pais). Muitas das
inseguranças infantis, que aparecem até de forma recorrente e nem sabemos de
onde vieram, são decorrentes desse tipo de intervenção.
Além disso, qual o pai ou
mãe que, DE FATO, vai embora do Shopping? É claro que não vamos. Por mais que
os ameacemos não cumprimos o que prometemos e, assim, fracassamos a nossa
autoridade perante os olhos daqueles que deveriam reconhecê-la: os nossos filhos.
Esses dois motivos são
suficientes para refutar esse tipo de ação e afirmar: elas são demasiadamente
inadequadas. Entretanto, vocês devem estar se perguntando, o que farei?
Deixarei ele berrar até cansar? Claro que não!
Para decidir de forma
consciente como proceder, devemos entender o que leva uma criança a respeitar
determinada regra, como não berrar, por exemplo.
Para que uma criança
respeite a regra ela precisa respeitar aquele que institui a regra, no caso, o
pai, a mãe ou qualquer outra figura de autoridade. Isso porque, ainda pequena
(por volta dos 4 anos até os 9, mais ou menos), ela é heterônoma (ou seja, encontra-se,
do ponto de vista do desenvolvimento moral,
na moral da obediência), o que quer dizer que não respeita a regra por
reconhecer que ela é importante, mas sim pela pessoa que impõe ou apresenta a
regra.
Seria maravilhoso se nossos
filhos tivessem condições de pensar: não vou berrar no shopping porque isso
incomoda as pessoas. Bem, seria ideal, mas não é real. A realidade é que nossos
pequenos respeitam as regra em função da pessoa que institui essa regra e, para
isso, precisam sentir por ela, ao mesmo tempo, amor, medo e confiança. Isso
explica porque uma criança respeita uma pessoa e não faz o mesmo por outra.
Assim, precisamos entender
que a criança passa a respeitar as regras (como não se jogar no chão, por
exemplo) não porque compreende que são importantes e as reconhecem como
necessárias, mas porque foi capaz de desenvolver um sentimento de respeito pela
pessoa que institui a regra, passando, por isso, a compreender uma
obrigatoriedade no cumprimento dela.
Dessa forma, a afetividade
passa a ser ponto-chave no despertar do senso moral, uma vez “a criança pequena
respeita seus pais ou demais pessoas para elas significativas porque elas lhes
inspiram, ao mesmo tempo, amor e medo” (LA TAILLE, 2006, p. 109).
O que quer dizer esses dois sentimentos? o amor é uma
forma de apego e admiração natural que a criança desenvolve pelas pessoas
significativas para ela. Já o medo não é o temor causado por chantagens ou
amedrontações utilizadas em outrora como “práticas educativas” (se levante se
não eu vou embora e vou lhe deixar aqui). O medo é o temor pela possibilidade da retirada desse amor
que ela sente, decorrente da desproteção sentida pela criança em situações de
punição.
Dessa forma, compreendemos
que num primeiro momento a criança obedece às regras morais porque deseja,
sobretudo, agradar as figuras significativas de autoridade, obtendo a aprovação
dos mesmos.
Entretanto, mesmo pequenas crianças deixam de cumprir algumas normas instituídas por
pessoas significativas. O que leva a esse tipo de conduta?
Se o amor e o medo são
fundamentais, não são os únicos sentimentos necessários. Passemos a confiança. A
confiança se constitui num sentimento complementar ao de amor e medo, relacionando-se
a confiança na figura de autoridade.
Esse terceiro sentimento é
fundamental no desenvolvimento da moralidade, visto que, em função de ainda
estar na heteronomia, a criança precisa confiar nas qualidades morais das
pessoas para que possa adotá-las em sua vida.
Dessa forma, quando meu
filho se jogar no chão e fizer a maior birra do mundo, eu devo evidenciar que
aquilo não pode ser feito, desaprovando sua conduta, a partir da explicação do
porquê ela não é adequada. Também tenho que lembrar que preciso ser um exemplo para ela, visto que isso é necessário para que ela possa confiar em mim e nas regras que instituo para ela (nesse caso não vale o ditado: faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço).
Certamente, por sentir por
mim amor, medo e confiança ele irá, pouco a pouco, abandonando as birras. Se
isso não acontecer, antes de ameaçá-lo de abandono, devo me perguntar: será que
estou sendo para meu filho alguém capaz de despertar nele tais sentimentos?
É muito mais a resposta a
essa pergunta que me ajudará na resolução dos problemas do que as usuais
ameaças de deixá-lo sozinho em qualquer lugar. Assim, para pôr fim as birras infantis devemos percorrer o caminho do amor e não do abandono.