quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

A bula Pula-pula e as aulas de brincadeira

Ontem, na noite de Natal, o pequeno Tomaz ganhou um presente do Tio Bruninho e da Tia Ritinha: uma bola pula-pula da Galinha Pintadinha.  Como já estava dormindo, deixamos para abrir o presente com ele, a fim de que aproveitasse o carinho recebido desde o momento de rasgar o papel até o de brincar, no sentido literal da palavra.
Confesso que hoje pela manhã, enquanto ele abria a embalagem, meu coração neurótico-materno (sim, eu sei que isso é pleonasmo), tremeu imaginando: este é o tipo de brinquedo que certamente causará acidente!
Mesmo assim, superei, segui em frente, e ajudei meu filhote a abrir o brinquedo e explorá-lo. Logo no primeiro momento ele tentou dar sentido ao objeto, uma vez que era a sua primeira experiência com uma bola que possui duas orelhas.

Olhou, pensou e, sem saber que era para sentar em cima e pular, tratou de me dizer:
- Você é Tia Bela e eu sou seu aluno! – após esta frase, sem que eu pudesse respondê-lo, voltou a prosseguir:
- Tia Bela, qual a atividade de hoje? – e ainda sem me deixar falar, completou:
- Deitar na bola, rolar e cair sem deixar bater a cabeça.
A mim restou sorrir da sua explicação e entender o motivo da utilização desse argumento... A explicação dessa experiência é a razão do post de hoje que terminou sendo completamente maternogógico, contemplando o verdadeiro duelo das duas mulheres que moram em mim: a mãe e a pedagoga.  
Há mais ou menos 6 meses o pequeno Tom iniciou uma atividade chamada Moviment Kids no mesmo local onde ele faz natação: ALL 4 KIDS. Esta aulinha, carinhosamente chamada por ele de brincadeira, tem como objetivo estimular habilidades motoras, focando, sobretudo, na força, no equilíbrio e na consciência corporal.
Eu adoro tudo o que ele aprende lá e acho o máximo ele nomear dessa maneira - aula de brincadeira - porque esta mãe pedagoga entende que ele aprende da forma mais significativa que um serzinho da idade dele pode aprender: brincando.
E foi lá que ele aprendeu a rolar sobre um cilindro, mais ou menos como a bola que ganhou, e, por isso, foi lá que ele adquiriu conhecimento prévio suficiente para levantar a hipótese de que era essa a finalidade do objeto que lhe foi dado pelos seus tios.
Vejamos bem! Piaget nos explica que um novo conhecimento somente é possível porque há outros anteriores, levando-nos a compreender que é dessa maneira que se desenvolve a inteligência. O grande mestre nos explica que desde o nascimento as pessoas começam a realizar processos contínuos e infinitos de desenvolvimento, partindo de estruturas mais simples rumo a outras mais complexas.
Essa evolução se dá passo a passo, de modo que as estruturas cognitivas anteriores são condições prévias para a elaboração de outras mais complexas. Ao agir sobre um novo objeto ou situação que entre em conflito com as capacidades já existentes, as crianças fazem um esforço de modificação para que suas estruturas compreendam a novidade.
Foi exatamente isso que fez o meu pequeno, ajustando suas experiências anterioes a nova situação de conflito. Ele sabia, a partir do que vivia com Tia Bela, que objetos como aquele serviam para rolar e cair. Mesmo que a bola pula-pula, como o próprio nome diz, tivesse outra função, Tomaz ainda não tinha nenhuma experiência anterior que lhe permitisse levantar essa hipótese, e, buscando equilibrar-se diante o objeto (equilibrio aqui no sentido piagentiano), recorreu às suas experiências das aulas de brincadeira.
É fantástico entender porque meu filho agiu dessa maneira! É mais fantástico ainda entender o que aprendi ainda na faculdade: a evolução do conhecimento se dá a partir do que a criança já sabe - a ideia-âncora - servindo de ponte para a construção de um novo conhecimento por meio da reconfiguração das estruturas mentais existentes ou da elaboração de outras novas.
Foi assim que o Tom fez. E é por isso que todos nós que lidamos com crianças – pais, educadores, cuidadores, etc. - deveríamos entender que os conhecimentos prévios são muito importantes ao desenvolvimento, porque somente é possível avançar no desenvolvimento se a intervenção educativa levar em consideração o ponto de partida de cada um (isso é algo ímpar e intranferível).
É justo por isso que o Piaget nos diz no livro Problemas de Psicologia Genética : "Para que um novo instrumento lógico se construa, é preciso sempre instrumentos lógicos preliminares; quer dizer que a construção de uma nova noção suporá sempre substratos, subestruturas anteriores."
É pelas estruturas anteriores e por tudo que aprende nas aulas de brincadeiras que me resta a agradecer a Tia Bela, por ter ensinado algo tão importante ao meu filho.
Sim, saber cair (no sentido denotativo e conotativo), certamente, é uma competência que levaremos por toda vida e é por isso que minha gratidão se dá, justamente, porque sabendo rolar sobre a bola com uma desenvoltura de quem já se tornou expert, meu coração  neurótico-materno tem mais um pouco de sossego e, o que é mais importante, meu filho tem mais segurança não apenas física, mas, também, emocional.
  Obrigada, Tia Bela, essa atividade aqui em casa, não precisa mais de capacete (rsrrsrsrs).




quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O dia que Tom saiu e só queria voltar semana que vem



Hoje o pequeno Tomaz estava em sua aula de movimento, carinhosamente chamada por ele de “aula de brincadeira”. Ao ser direcionado pela professora para realizar uma atividade que não queria, prontamente lhe disse:
- Então eu vou embora e semana que vem eu volto!
Como pode uma criança tão pequena dessas querer decidir quando e como desempenhará suas atividades? Certamente esta é a primeira pergunta que surge em nossas cabeças.
Em seguida, podem surgir dúvidas quanto aos limites que são postos ao meu gordinho. Antes de qualquer julgamento precipitado, destaco logo que ele recebe limite sim e que aqui em casa consideramos que os limites são, sem dúvida, fundamentais na formação moral da criança, visto que, sem eles, a liberdade vira licença e a autoridade vira autoritarismo.
O que acontece é que Tomaz, como qualquer criança de sua idade, tem dificuldade de se frustrar. Isso porque, vivenciar a frustração e a decepção, embora seja um processo natural de crescimento das crianças, não é algo simples. Assim, quando as coisas não saem como elas desejam ou idealizam, vai embora o sentimento mágico de que tudo vai dar certo e de que basta o desejo dela para que as coisas aconteçam.
Quando a realidade é outra, a criança sente tristeza e, justo por isso, ela faze birra, grita e esperneia como forma de significar o sentimento negativo que experencia.
Compreendendo esta questão, percebo até como positivo Tomaz propor ir embora. Isso demonstra que ele está amadurecendo na externalização de seus sentimentos. Ao invés de se jogar no chão e bater pernas, ele sugere ir embora fazendo uso da linguagem oral para dizer que não gostou. Sem dúvidas, essa é uma proposta mais assertiva quando falamos em expressão dos sentimentos.
Antes que algum julgador de plantão esteja por aqui pensando que ele faz o que quer e bem entende... destaco logo: eu não deixaria ele ir embora (embora não tenha intervido porque esta era tarefa da sua professora). Por mim explicaria a ele que a gente não pode ir embora na hora que queremos e aí veria se ele iria gritar ou encontrar outra frase oportuna para significar seu sentimento de frustração.  

Agora só me resta a curiosidade, mas, se bem conheço meu filho, tenho certeza que ele teria outra frase espetacular para ajudá-lo a lidar com a frustração natural da condição humana.