domingo, 9 de julho de 2017

Por que a adoção demora tanto?

Como a maioria já sabe, estamos num processo para ingressarmos no Cadastro Nacional de Adoção há mais ou menos 8 meses. Neste período de quase uma gestação, já enfrentamos angústias referentes ao que consideramos morosidade do processo (foram 7 meses para a primeira entrevista), já enfrentamos tristeza pelas dificuldades que aparecem e, no post de hoje, falarei sobre nossa surpresa em sabermos que há muito mais casais para adotar do que crianças em condições de serem adotadas.

Por mais estranha que esta informação pareça, na nossa primeira entrevista fomos informados de que hoje não há nenhuma criança no cadastro-CNA em condições de ser adotada para o perfil que escolhemos (crianças até 6 anos de qualquer sexo ou localidade do país). Isso porque, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção somente pode acontecer quando a família de origem for destituída do poder familiar, os pais biológicos forem desconhecidos ou, em sendo estes falecidos, não existir parentes disponíveis a acolher a criança.

Desse modo, a maioria das crianças que hoje estão abrigadas ainda permanecem com vínculos jurídicos com suas famílias de origem e, para nossa justiça, a preferência é que se priorize o seu retorno para o convívio com esta família. A preservação dos vínculos familiares é um dos aspectos fundamentais do acolhimento de crianças e adolescentes, fundamentado na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária, nas Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes e na Lei da Adoção.

Confesso que, vivendo a experiência vagarosa de me tornar uma pretendente à adoção (embora esteja há 8 meses neste processo, ainda não ingressei no CNA) sou acometida de um sentimento bastante ambivalente: compreensão e revolta. Explico-me melhor: compreendo a importância da convivência com a família de origem e a necessidade de ser respeitar o amparo legal que prioriza a preservação dos vínculos familiares, mas, ao mesmo tempo, me indigno que se passe tanto tempo tentando resgatar vínculos que justifiquem o retorno de uma criança para uma família que, por vezes, não a quer ou não tem como cuidar dela.
                                                                   
Enquanto isso, mais de 4 mil casais encontram-se, hoje, em condições de adotar uma ou mais crianças, desejosos por constituírem uma família e, diante do cenário atual, não conseguem. Isso porque mais da metade das crianças abrigadas não podem ser adotadas. Com isso, o tempo passa, as crianças crescem e muitas delas não conseguem ser adotadas (já que a adoção tardia ainda é muito tímida no Brasil) nem, tampouco, voltar às suas famílias de origem.

Muitas campanhas têm sido criadas estimulando os casais a adotarem crianças mais velhas. Acho muito válida a ação. Entretanto, isso é insuficiente. É preciso agilizar o processo. É necessário que estudos sejam realizados e publicados esclarecendo como tem sido o retorno das crianças às suas famílias e como tem se dado o desenvolvimento afetivo, cognitivo e social dessas crianças que regressam aos seus lares de origem.  

Isso porque boa parte das crianças e adolescentes que estão em abrigos lá estão por terem seus direitos violados, sofrendo abandono, risco pessoal/social, negligência de seus pais/responsáveis, carência extrema de recursos, abandono, violência doméstica, dependência química, vivência de rua e a orfandade. Neste sentido, são comuns as dificuldades para a reinserção familiar em decorrência de episódios de ameaça ou violação dos direitos de crianças e adolescentes, tornando-se urgente que pensemos em formas mais eficientes de garantir um direito fundamental às crianças: direito a um lar e a uma família.

Falo isso por ter vivido ontem meu primeiro encontro no Grupo de Estudos e Apoio à Adoção (GEAD Recife). Nele, pudemos ouvir depoimentos de 04 pessoas adotadas que hoje são adultos extremamente gratos à possibilidade de terem vivido em suas famílias afetivas. Família não é a consanguínea (não em minha opinião), mas, sim, aquela em que cuidamos e somos cuidados, amamos e somos amados, respeitamos e somos respeitados.

Por que negar isso a uma criança por tanto tempo em nome de preservar vínculos com pessoas que, nem sempre, podem ser chamadas de família? Muitas vezes, as situações que levaram à perda do poder jurídico da família em relação à criança podem, ainda, não ter sido superadas e podem, inclusive, nunca ser. Desse modo, levanto outra questão: qual o tempo ideal em que devemos manter a busca pelo reestabelecimento dos vínculos?

Não tenho resposta para estas questões. Só tenho um desejo imenso de que as crianças e adolescentes deste país sejam sempre tratados como prioridade. Se for melhor para elas, de fato, que os vínculos familiares sejam mantidos, desejo que o Estado consiga fazer a reintegração familiar eficientemente.


Caso o melhor para estas crianças seja a aquisição de uma nova família via processo de adoção, desejo que o Estado repense as políticas atuais e torne o processo mais célere, a fim de que tantas famílias dispostas a amar uma criança tenham a possibilidade de doar este amor.

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