Senta que lá vem história...
Tomaz
espalha no chão uma quantidade quase infinita de brinquedos que mal nos permite
ver a cerâmica do piso. De repente, ele decide pegar outra caixa cheia de
pecinhas minúsculas para espalhá-las no chão. Neste momento, eu lhe digo:
- Tomaz, antes de começar a brincar com estas pecinhas você irá,
primeiro, juntar estas outras.
Ele, então, me responde:
- Não vou não, mamãe!
Então, eu lhe digo:
- Eu não estou perguntando se você vai vir, eu estou dizendo que você
vai. Agora escolha se quer vir andando, ou quer que eu ajude você a chegar aqui
(apontando para o local onde estão todos os brinquedos no chão.
O pequeno para, me olha e responde:
- Eu vou, mas bem devagarzinho.
Mesmo com vontade de rir, eu mantenho a seriedade e prossigo:
- Tudo bem! Você pode vir rápido, normal, devagar... Mas tem que
vir!
E assim, em passos quase minúsculos, ele começa a se deslocar até
minha direção e junta todos os brinquedos no seu próprio tempo (que durou uns
15 minutos).
Fico imaginando algumas
pessoas presenciando esta cena e pensando: “como a mãe deixa ele lhe dar uma
resposta destas”; “Se fosse meu filho, me levantava e lhe dava uns tapas que,
num instante, ele viria correndo”; “se continuar assim, quando crescer, vai
bater em vocês”.
A estas pessoas o que posso
dizer é: não, ele não me faltou com respeito. Ele não gritou comigo, não usou
palavras inadequadas e, inclusive, atendeu ao meu comando. O que acontece é que
nesta fase do desenvolvimento as crianças estão em processo de construção da
identidade e, justamente por isso, precisam se reconhecer como diferentes das
outras pessoas – ou seja, ele é diferente de mim e, justamente por isso, não
precisa agir do meu modo.
O que meu pequeno estava
dizendo com seus passos lentos era: “eu também tenho direito de pensar e
decidir, escolhendo como cumprirei esta obrigação de juntar os brinquedos”.
Isso não é ruim, muito ao contrário. Nesta idade é importante que ele tenha limite
sim, mas isso ele teve. O que eu procurei foi dar ao meu pequeno oportunidade
para que ele entendesse que suas particularidades
são respeitadas em nossas interações, fortalecendo sua autoconfiança e,
sobretudo, a idéia de que também é respeitado pela mãe.
Digo isso porque penso que o respeito é condição importante e
imprescindível nas interações sociais e, se eu desejo que meu filho aprenda a
respeitar, eu preciso, primeiro, fazer com que ele se sinta respeitado. Esta é
minha responsabilidade, pois é na proteção que eu sou capaz de oferecê-lo que o
Tom se inserirá no mundo, replicando a qualidade dos relacionamentos
estabelecidos dentro da nossa família, o que, certamente, poderá influenciar na
formação da identidade.
A identidade está ligada às características que compõem o que são
próprias do indivíduo, diferenciando-o do outro. A noção de identidade sugere
que o sujeito precisa de outro para se desenvolver, para adquirir atitudes,
valores e princípios que vão norteá-lo em sua vida adulta e social e, à medida
que a criança cresce e se desenvolve, ela vai se tornado uma pessoa
diferenciada dos pais, adquirindo com a ajuda deles, certa autonomia, num
processo de identificação.
Por isso, como eu não quero que o Tom seja um submisso ou alguém que violenta
as pessoas porque quer que tudo ocorra ao seu próprio modo, achei muito legal
que ele pudesse me dizer que viria devagarzinho.
Eu só espero que, também devagarzinho, eu oportunize ao meu pequeno
vivências que o levem a valorizar as particularidades, as diferenças, a
alteridade. Mesmo que isso seja, sempre, devagarzinho!
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